"Learn to look without imagination, to listen without distortion: that is all. Stop attributing names and shapes to the essentially nameless and formless, realize that every mode of perception is subjective, that what is seen or heard, touched or smelled, felt or thought,expected or imagined, is in the mind and not in reality, and you will experience peace and freedom from fear." - Nisargadatta Maharaj
Monday, November 26, 2007
O veículo do Atiyoga ou Dzogchen
Longchenpa
Embora classificado entre os tantras superiores, o Ati-yoga ou dzogchen não é uma via tântrica. Seu princípio é a auto-liberação das paixões e não sua transformação. Existe por outro lado uma diferença capital entre os oito primeiros veículos e o dzogchen. Os primeiros utilizam a mente comum, sem como caminho. No dzogchen, é rigpa que é utilizado.
Rigpa é um termo específico de tal modo rico e além dos conceitos que ninguém até agora propôs uma tradução satisfatória para defini-lo. Para palavras de uma tal importância, a tradução por um só vocábulo corre o risco de levar a uma redução conceitual do sentido. Eu escolhi cercar sua definição da melhor maneira, sem buscar em seguida traduzir a palavra rigpa nos textos.
Em inglês, rigpa é freqüentemente traduzido por awareness (consciência desperta) e K. Lipman recentemente tentou uma definição: "The flash of knowing that gives awareness its quality", empregando a fenomenologia. Esta definição, "O clarão do conhecimento que dá ao despertar suas qualidades", é interessante porque ela dá valor ao aspecto cognitivo de rigpa, que dá todo seu valor ao despertar.
No "Rigpa ngotrö tcher thong rangdrol", rigpa é assim representado:
Quando os pensamentos se esvaeceram sem deixar traço algum,
Nesse frescor aonde os pensamentos a vir ainda não apareceram,
No instante onde se estabelece o modo natural sem artifícios,
Eis aqui esta consciência dos tempos comuns,
E desde que fixeis vosso olhar sobre vós mesmos,
Esse olhar que não tem nada para "ver" deságua sobre a claridade,
Rigpa em sua evidência, nu e límpido;
É uma pura vacuidade onde nada de particular existe,
Onde claridade e vazio são indivisíveis,
Nem é eterno, pois que nada existe verdadeiramente,
Nem é o nada, pois que ele é claro e vivo.
Ele não se reduz ao um, estando presente e consciente em tudo,
Ele não é o múltiplo, porque ele tem um único sabor na inseparabilidade.
Tal é esse rigpa natural, e nada além.
Rigpa é um estado de presença claro e desperto que transcende a mente pensante comum. Ele é como o sol que aparece quando as nuvens dos pensamentos se afastam. Rigpa é não-composto, não tem começo nem fim. Em sua essência ele é primordialmente puro [kadag] e sem elaborações, o que chamamos ainda vacuidade. Mas em sua natureza, ele é luminosidade espontaneamente presente [lhundrup]. Esses dois aspectos são indissociáveis.
Do ponto de vista de rigpa, a mente conceitual sem, as paixões, etc., não são senão um jogo oriundo de sua criatividade luminosa. Há, pois uma imensa diferença entre mente comum, sem e rigpa. Sem é um epifenômeno de rigpa, uma simples função da claridade e de seu movimento. Rigpa é um estado claro e sem distrações onde nenhum apego é possível. Nesse estado, tudo que surge não é mais que uma exibição sem finalidade e dissolve-se sem deixar traço, como uma vaga no oceano ou um desenho sobre a água.
Comparamos tradicionalmente rigpa a um espelho. O espelho tem duas características: ele é vazio em si-mesmo, e simultaneamente ele tem potencialidade de refletir claramente todas as espécies de aparências, belas ou feias. Essas aparências, visíveis no espelho, são incapazes de o sujar, pois ele permanece vazio por essência. Estar sob a influência da mente comum e do apego, é estar fascinado pelos reflexos e se lançar em perseguição, seduzido por uns, irritado ou desgostoso com outros. Estar no estado de rigpa consiste em contemplar a exibição dos reflexos permanecendo na condição natural do espelho, sem estar distraído. Os reflexos não têm nenhum poder sobre o espelho, e este permanece imutável e sem manchas. Assim, do ponto de vista do espelho os reflexos não criam nenhum problema. Se quando vemos as projeções, esquecemos no mesmo instante a condição natural, a ilusão se instala.
Nos textos antigos do dzogchen, em particular do semde, rigpa é também chamado tchang tchoup sem, quer dizer bodhichitta ou "mente de iluminação". Mas esse termo tem uma significação especial no dzogchen. Tchang significa "totalmente puro", sendo sinônimo de kadak. A pureza primordial de rigpa. Tchoup significa "realizado", "perfeito", e evocando aqui a natureza espontaneamente realizada de rigpa [lhundrup]. Sem é, pois aqui a natureza da mente primordialmente pura e espontaneamente presente, e não mais a mente no sentido comum.
Rigpa é nossa condição natural, nosso modo de ser último e primordial. Presente em cada um dos seres sensíveis, embora velado, o chamamos também tathâgatagarbha, a "essência do tathâgatha". Dum ponto de vista último, rigpa é também Samantabhadra, o Budha primordial. Enfim, enquanto presença espontânea capaz de manifestar todos os fenômenos, o chamamos "o rei que cria todas as coisas". Todos esses termos são equivalentes e tais diferenciações são usadas somente com uma finalidade descritiva.
Um último ponto importante a propósito de rigpa. Na nossa condição comum, nós não reconhecemos rigpa, e somente sem nos parece ser a mente. Nos textos, falamos em procurar a "natureza da mente", semnyi. Descobrir a natureza da mente é descobrir que sem não tem realidade, que ela é vazia de existência própria, que ela não tem nem origem, nem lugar, nem destino. Mas isso ainda não é rigpa. Rigpa é apresentado ao discípulo no momento preciso quando a mente comum é temporariamente dissolvida. Se o estudante reconhece no instante esta presença vazia e luminosa, sem nenhum apego nem conceito, podemos então falar do estado de rigpa.
Assim, o Ati-yoga é o veiculo de rigpa que transcende todas as análises conceituais, todas as elaborações e fabricações mentais. Enquanto tal, ele está além de todas as opiniões e das "vias" dos outros veículos, que dependem ainda da mente pensante, sem. [...]
O veículo do dzogchen se inicia somente com a compreensão e a experiência de rigpa, existe um modo de transmissão de poder particular no dzogchen, que visa a apresentação direta de rigpa ao discípulo. Esta transmissão, o rigpa tsel wang ou "transmissão de poder da energia criadora de rigpa", corresponde à quarta iniciação dos tantras, a iniciação da fala.
Existem numerosas espécies em cada uma das três séries dos ensinamentos dzogchen [semde, longde, e menagde]. Esta apresentação pode ser direta de mente a mente, simbólica ou oral. Numerosos procedimentos são utilizados. Assim existem as apresentações metafóricas, as apresentações dos sentidos, e as apresentações do signo [sinal]. Enfim, existem quatro graus de elaborações para essas transmissões de poder: transmissão de poder elaborada, transmissão de poder sem elaborações, transmissão de poder completamente despida de elaborações e transmissão de poder absolutamente despida de elaborações.
Em todos os casos, o mestre, que se encontra no estado de rigpa, tenta desvelar ao discípulo o que é seu rigpa afim de que ele tenha a experiência direta e, sobretudo o reconheça. Este reconhecimento da visão mesmo que fugaz, é indispensável ao desenvolvimento da prática, porque, sem saber do que se trata, como poderemos "desenvolver" a presença de rigpa? A prática visa, com efeito, um único objetivo, estabilizar a visão e aumentar o poder de rigpa, afim de que ele impregne progressivamente todos os nossos atos.
Fonte: Do livro "La liberté naturelle de l’esprit", apresentado e traduzido do tibetano por Philippe Cornu - Tradução para o português Karma Tenpa Dharguye. http://www.nossacasa.net/shunya/default.asp?menu=1166
Labels:
Dzogchen,
Mind Nature,
Portuguese,
Vajrayana
Subscribe to:
Post Comments (Atom)
No comments:
Post a Comment